quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Evangélicos, Vocês Estão Errados Sobre Suicídio e Doença Mental



Por Emy Simpson, cristã e autora do livro Troubled Minds: Mental Illness and the Church's Mission, sobre cristãos portadores de doenças mentais.
 Como tenho escrito sobre as doenças mentais e a igreja ao longo dos últimos anos, eu tenho me dirigido a igreja em geral. Mas hoje, particularmente, quero me dirigir aos meus companheiros evangélicos.
Uma pesquisa recente da Life Way Research produziu algumas estatísticas interessantes relacionados com a doença mental, entre eles duas estatísticas que revelam um contraste chocante. Entre os evangélicos pesquisados, 64% acreditam que as igrejas devem fazer mais para prevenir o suicídio. Ao mesmo tempo, 48% acreditam que a doença mental grave pode ser curada somente pela oração.
Pois bem, aqui está o que eu acho chocante: Essa segunda estatística revela uma atitude que realmente contradiz o que 64% alegam sobre o que eles querem que a igreja faça. 
Aqui vai uma dica: Se você acredita que as igrejas devem fazer mais para ajudar a prevenir o suicídio, aqui está uma forma tangível e rápida para ajudar agora: Pare de dizer às pessoas que elas podem curar a doença mental apenas com oração.
Concordo, só porque as pessoas dizem que a doença mental pode ser superada com o estudo da Bíblia e oração não significa que essas mesmas pessoas iriam desencorajar o tratamento médico e a psicoterapia para alguém com doença mental.
Mas em inúmeras igrejas, tais crenças são amplamente sustentadas e disseminadas. E, em outras, embora a procura de tratamento não seja abertamente condenada, a oração e estudo da Bíblia continuam prescritos como o primeiro passo para tentar evitar o tratamento e isso, para muitas pessoas, tem o mesmo efeito de desencorajar essa procura. Isso, certamente, tem o efeito de retardar o tratamento e esse atraso aumenta a probabilidade de que a doença mental venha a se tornar mais grave, podendo causar graves perturbações ao funcionamento da pessoa e, potencialmente, custar sua própria vida.
Enquanto a maioria das pessoas que são portadoras de uma doença mental (mais de 25% da população adulta americana) não morrem por suicídio, a maioria dos especialistas afirmam que pelo menos 90% das pessoas que morrem por suicídio tem um transtorno mental diagnosticável, que pode muito bem ser tratado E muitas dessas pessoas não recebem tratamento para a sua saúde mental. Obviamente é o tratamento e a gestão adequada da doença mental que são a forma – possivelmente a forma mais importante – de prevenir o suicídio. E a oração por si só, embora sendo útil, não é o tratamento adequado da doença mental. Na verdade, a maneira mais segura de conduzir as pessoas para mais perto do abismo do desespero consiste em dizer-lhes que a sua doença mental é simplesmente um problema espiritual; diga-lhes em seguida para orar e, em seguida, quando a oração não funcionar, basta dizer-lhes para orar com mais fé. 
Colocar uma carga espiritual pesada sobre as pessoas que sofrem de uma doença mental grave é uma forma de incentivar o suicídio, não de impedi-lo.
 É fácil para a maioria de nós compreendermos que se você diz a alguém com câncer, diabetes ou insuficiência renal que a oração é a melhor maneira de tratar a sua doença com risco de vida, e por causa de seu conselho essa pessoa recusa o tratamento médico, você está contribuindo para a sua morte. 
Você sabe que uma doença mental grave é também uma condição que coloca a vida em risco? Você sabe disso? De acordo com a Organização das Nações Unidas e do Instituto Nacional de Saúde Mental, em média, os americanos com doença mental grave morrem 14 a 32 anos antes do que a população em geral. A esperança média de vida para as pessoas portadoras de uma doença mental grave variam de 49 a 60 anos de idade. Compare isso com a expectativa de vida média nos Estados Unidos: 78,6 anos. O suicídio é apenas uma pequena razão para esta diminuição na esperança de vida, mas é significativa. Pessoas com esquizofrenia são 50 vezes mais propensos a tentar o suicídio do que a população em geral. Entre as pessoas com diagnóstico de transtorno bipolar, pelo menos, 25 a 50% fazem uma tentativa de suicídio. Entre as pessoas com depressão maior, a taxa de suicídio é 8 vezes superior à da população em geral. Portanto, para qualquer um que, hipocritamente, disser a essas pessoas que elas não têm uma condição médica que requer tratamento e que uma atividade religiosa mais cheia de fé e entrega à Deus é tudo que eles precisam, eu digo que essa é uma atitude indesculpável.
Considere o que acontece quando, apesar de orações sinceras e frequentes das pessoas, esta receita simplesmente não funcione, como inevitavelmente é o que acontece com a maioria das pessoas. Seu conselho equivocado condenou-as a sofrer ainda mais, pois acrescentou em cima de sintomas da doença mental grave, sentimentos de inadequação espiritual ou abandono. A que outra conclusão chega essa pessoa, senão que suas orações não são boas o suficiente ou que Deus se afastou delas?
Acredite: se só a oração fosse a cura padrão para a doença mental, minha mãe seria saudável e completa, ao invés de uma pessoa devastada pelos sintomas da esquizofrenia. Na verdade, se a fé fosse uma vacina eficaz para distúrbios cerebrais, ela nunca teria desenvolvido essa doença. Se ir a uma reunião de oração evangélica assegurasse saúde mental, nenhuma das pessoas sobre as quais eu escrevi em meu livro (Troubled Minds) teriam algo a dizer. Eu entrevistei fiéis cristãos que tomam medicação, se envolvem em terapia, participam de grupos de apoio, e sim, com certeza, oram regularmente.
Deus pode curar qualquer um, e às vezes ele faz isso milagrosamente. Mas na maioria das vezes, ele não o faz. Tal reconhecimento não põe em causa a grandeza de Deus ou de sua bondade. Ele nos colocou em um mundo onde vivemos dentro dos limites das leis naturais que ele criou e com a presença de doença, decadência e morte. Doença mental, como outras doenças, é uma realidade da vida em um mundo onde partes do nosso corpo, incluindo o cérebro, ficam doentes e passam a apresentar um mau funcionamento. Veja! Nós não consideraríamos aceitável, de forma nenhuma, prescrever exclusivamente a oração, sozinha, para o tratamento de fígados doentes, corações e pâncreas; porque prescrevê-lo para cérebros desordenados? A oração é fundamental para uma vida espiritual saudável, se estamos ou não estamos sofrendo de doença grave. Mas isso não é um substituto para o tratamento médico responsável.
Eu amo a igreja, e eu sou um grande fã das muitas maneiras que Deus vem usando o povo cristão como uma força para o bem deste mundo. Mas, às vezes, na nossa ignorância, equívoco, teimosia, preguiça, medo ou desejo muito humano de acreditar que como cristãos merecemos uma vida melhor do que outros, em nada estamos ajudando, mas somente fazendo aumentar o problema. Para os cristãos que acreditam que oração e o estudo da Bíblia são as substituições corretas para o tratamento dos distúrbios mentais, esta é a hora.
É a hora de todos nós aprendermos e falarmos a verdade: e ajudarmos a salvar vidas.


Se você ou alguém que você conhece precisa de ajuda, ligue para o telefone do CVV: 188 e procure ajuda especializada de um psicólogo ou psiquiatra.




Texto original: Evangelicals, You’re Wrong about Mental Illness Published September 20, 2013 by Amy in ChurchMental HealthMental Illness
http://amysimpsononline.com/2013/09/evangelicals-youre-wrong-about-mental-illness/
  

 Tradução livre e adaptada




quarta-feira, 21 de setembro de 2016

A Fábula da Semente de Mostarda


 O sofrimento é uma realidade para todos nós. Independente de idade, sexo, classe social, raça, etc, o sofrimento, definitivamente atinge a cada um de nós. Sofrer é inerente à condição humana!
Em seu texto O Mal-Estar na Civilização, Freud destaca que o sofrimento nos ameaça a partir de três fontes:
1) A partir do mundo externo, que nos ameaça com suas forças esmagadoras e impiedosas: é o caso das tragédias naturais;
2) A partir do corpo, que destinado à ruína, não pode evitar a dor e a angústia: é o caso da morte e das mais diversas doenças;
3) A partir dos vínculos com os outros seres humanos: esse conhecemos bem, pois é o caso das “tragédias” provocadas pela multidão de nossos relacionamentos disfuncionais, no ambiente de trabalho, nas relações amorosas, no casamento, com os filhos, com a mãe, com o pai, com outros seres humanos e de toda ordem.
Como psicólogos, parece que estamos mais diretamente metidos no ofício de tratar, amenizar e, quem sabe, resolver, os sofrimentos oriundos das segunda e terceira fontes. Constitui-se na nossa tarefa um combate diário, árduo, contra os relacionamentos disfuncionais e os consequentes transtornos que causam nos sujeitos; e um combate contra as desordens/doenças mentais, na forma das mais diversas psicopatologias tais como as catalogam os manuais. É a nossa rotina. Psicoterapia e fármacos tem sido as nossas mais potentes e principais armas.
Entretanto, cabe interrogar se essa estratégia de combate focada no sofrimento não tem sido uma estratégia equivocada. Diante do sofrimento o nosso foco não deveria se voltar não para o combate ao sofrimento, mas para a promoção da saúde e o desenvolvimento da sabedoria, como uma nova estratégia? Com essa nova estratégia, talvez, não alcançaríamos melhores resultados?
Bem, tenho pensado...

“A jovem esposa de uma próspera família, de nome Kisa Gotami, perdeu o juízo em consequência da morte de seu bebê. Apertando o corpinho frio em seus braços, Kisa Gotami vagava pelas ruas, suplicando a todos os que encontrava que recuperassem a saúde de seu filho que ela julgava “doente”.
- Por favor, me dê um remédio para curar o meu filhinho!
Ela tocava nas casas e era humilhada: As pessoas, impacientes, batiam a porta em sua cara. Depois riam e comentavam:
- Que mulher louca! Ela não está vendo que a criança está morta!
A jovem ouvia o que lhe diziam, mas não queria acreditar.
- Por que você não se mexe, meu filho? Eu quero você de novo andando e brincando – pensava ela.
 – Por favor, me dê um remédio para o meu filho, ele não se mexe! Continuava em suas súplicas desesperadas.
Um homem sensato se compadeceu da dor da mãe que não queria aceitar a morte do filho e disse:
- Eu não tenho esse remédio que você procura, mas eu posso indicar quem o tem.
-E eu te suplico: me diga quem é!
-Você precisa falar com Sakyamuni, o Buda.
A mulher à beira da loucura foi ver o Iluminado e exclamou, chorando:
- Senhor, meu filho estava brincando entre as flores e tropeçou numa serpente que se enroscou no seu braço. Depois ficou pálido e silencioso. Não posso aceitar que ele deixe o meu colo assim. Senhor, meu mestre, dá-me um remédio que cure o meu filho.
O Iluminado respondeu:
-Sim irmãzinha, há uma coisa que pode curar teu filho e a ti, se puderes consegui-la, porque os que consultam os médicos tomam o que lhes é receitado. Procura uma simples semente de mostarda preta, porém só deves recebê-la de uma casa onde nunca tenha entrado a Morte.
Aflita, a magra Gotami foi de casa em casa pedindo o grão de mostarda. As pessoas se compadeciam dela e lhe davam a semente, porém, quando ela perguntava se já tinha morrido alguém naquela casa, lhe respondiam:
-Ah! São muitos as pessoas queridas que já morreram nesta família. Não nos lembre da nossa dor.
Agradecida, ela lhes devolvia a semente de mostarda que não serviria para preparar o remédio e dirigia-se a outros que diziam a ela:
-Aqui está a semente, porém já morreu minha esposa.
-Aqui está a semente, porém o semeador morreu entre a estação chuvosa e a colheita.
- Pode levar esta semente, mas saiba a morte levou a nossa filha antes da hora.
E assim foi, o dia todo procurou, mas não encontrou nenhuma casa onde a Morte já não tivesse passado. Nenhuma semente serviria para trazer o seu filho de volta. No começo, achou que ninguém entendia a sua dor. No decorrer do dia, percebeu que a dor da morte não era só sua. Muitos sofreram com ela e ela sofreu ao ouvir histórias de pessoas que se foram, avôs, avós, pais, mães, filhos, filhas, irmãos, irmãs, empregados, amigos, parentes e até animais queridos.
Ela entendeu a mensagem do Iluminado. Enterrou sozinha o seu filho, mas sabia que era como se estivesse ao lado de muitos conhecidos e desconhecidos, dando o último adeus ao menino.
Kisa Gotami voltou até Buda, o Desperto, que lhe perguntou:
- Encontrou a semente?
- Não, Mestre.
- Mas procurando o que não poderia encontrar, achaste um amargo bálsamo.... Enterraste o teu filho?
- Sim. Sobre o meu seio, o meu menininho dormiu hoje o sono da morte. E eu só pude chorar sozinha.... De manhã estava sozinha, no fim da tarde, ainda sozinha, percebi que havia uma multidão comigo.
- Agora sabes que, cedo ou tarde, todo mundo chora uma dor ou uma dor semelhante à tua. ”

Nesse pungente exemplo de um encontro transformador entre a figura do Buda e a atormentada Kisa Gotami, vemos como uma profunda sabedoria é posta em ação na instrução aparentemente simples que o Mestre lhe propõe.  Ação que vai empurrando a jovem, lentamente, indiretamente e com perfeita delicadeza à um movimento de necessária descoberta e aceitação de uma situação que é comum a todos – a dor, a perda, a Morte – dissipando o seu delírio e transformando o seu sofrimento.



Se você ou alguém que você conhece precisa de ajuda, ligue para o número do CVV: 141 e procure ajuda especializada.

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

A Um Ausente

 
Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste.

Carlos Drummond de Andrade , "Farewell". Rio de Janeiro: Editora Record, 1996.




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quarta-feira, 14 de setembro de 2016

O “Setembro Amarelo” Visto Por Quem Teve Uma Perda Para o Suicídio


Setembro foi e sempre será um dos meses mais difíceis do ano para mim. É o mês destinado à campanha Setembro Amarelo, que tem como principal objetivo a prevenção ao suicídio. Eu sou uma sobrevivente de uma perda para suicídio. Eu perdi meu pai ao suicídio em 20 de janeiro de 2000. Lembro-me daquele dia vividamente e, desde então, sua falta nunca permitiu eu me tornar uma pessoa completa.

Quando a minha sobrinha fez 8 anos, em junho, eu chorei. Eu chorei sabendo que ela havia chegado à mesma idade que eu tinha quando perdi meu pai. Ela é uma menina cheia de vida e amor. Certa vez eu fui aquela menina, tão inocente, mas com a partida de meu pai aquela menina desapareceu dentro de mim rapidamente.

Por muito tempo eu tenho me depreciado e venho me fazendo muito mal, por me sentir ainda traumatizada e esmagada pelo acontecimento. Assistir minha sobrinha, por sua vez, comemorar seus oito anos de aniversário foi difícil, mas ao mesmo tempo, era quase como se eu tivesse tido um despertar.

Foi então que eu finalmente percebi a força que tenho, a coragem que eu ganhei. Comecei a me dar créditos por estar atravessando essa tumultuosa tempestade da perda de alguém tão amado. Embora eu esteja ainda cheia de ansiedade e pânico, sofrendo até hoje os efeitos duradouros do trauma e muitas inseguranças, eu continuo a colocar um pé na frente do outro.

Eu sou um trabalho em progresso. Levei 16 anos para compreender como o trauma do suicídio de meu pai marcou-me de forma tão dura e tão difícil. Eu comecei a me dar crédito, porque no final de cada dia eu retorno para casa, e para mim. Já quanto à tempestade, eu pretendo continuar nadando através de suas ondas, não importa quão pesada elas sejam ou quão grande elas fiquem tentando me engolir por inteira.

Através de minha jornada de perder meu pai ao suicídio, descobri que muitas pessoas giram em torno do tema do suicídio. É grande o estigma do suicídio; é tabu falar sobre, e as pessoas muitas vezes se sentem desconfortáveis ​​quando se torna um tema de conversa. Mas o suicídio precisa sim ser um tema de conversas porque ele é uma epidemia; as taxas de suicídio subiram substancialmente nos últimos anos, e elas vão continuar a subir se aqueles que tem necessidade de ajuda não conseguem, por uma razão o outra, obterem a ajuda de que necessitam.

Vivemos em um mundo onde o julgamento é um tema comum, onde pessoas podem ser odiosas e maldosas umas com as outras e não sentirem nenhum remorso com isso. É difícil viver em um mundo onde as pessoas vomitam veneno e ódio. Por isso, preste atenção, quando você perguntar a alguém como está passando, quero dizer, na conversa comum do dia a dia: "Como você está?" "Como vai você?" Saiba que essas três palavras podem fazer uma diferença profunda na vida de uma pessoa que está presa numa grande batalha consigo mesma. Você pode não acreditar nisso, mas compaixão e bondade sempre triunfam sobre o ódio.

É muito importante abrir um diálogo que nos desperte para uma maior conscientização sobre o suicídio e sua prevenção. Não permaneça em silêncio sobre esse assunto. Recentemente, li um livro chamado "Razões Para Estar Vivo", de Matt Haig. Ele escreve: "A vida está esperando por você. Você pode se sentir preso aqui por um tempo, mas o mundo não vai a lugar nenhum. Vá se segurando. A vida sempre vale a pena. " O Mês da Prevenção do Suicídio é para nos ajudar a ir segurando as pontas e para pensarmos juntos sobre aquelas razões pelas quais a vida vale a pena, se você vem achando que ela não vale mais.

É um mês para as pessoas manterem um diálogo sobre o suicídio, para compartilhar suas histórias, para que os que vivenciam esse problema saibam que não estão sozinhos. Para ter certeza de que é possível encontrar ajuda. É só quando o diálogo começa, que é quando a verdadeira mudança ocorre.

Lembre-se sempre, não importa o quão escuro fique, não importa quanto tempo a travessia do túnel possa durar, você nunca está sozinho.




Se você ou alguém que você conhece precisa de ajuda, ligue para o número do CVV: 141 e procure ajuda especializada.



Texto original: A Suicide Loss Survivor's Challenge for Suicide Prevention Month By Kaley Brown / https://themighty.com/2016/09/september-suicide-prevention-month-and-what-it-means-to-me/

Tradução livre e adaptada


domingo, 11 de setembro de 2016

Quando As Estatísticas Sobre Suicídio Estão Contra Você


Como uma pessoa transgênero, eu tenho 41% de probabilidades de fazer uma tentativa de suicídio. Por ser um jovem transgênero minhas possibilidades são ainda maiores. Como um estudante do ensino médio, eu tenho essas probabilidades aumentadas: um em cada seis estudantes do ensino médio já pensaram seriamente em suicídio, um em cada doze fizeram uma tentativa de suicídio. Todas as probabilidades estão contra mim, mas eu ainda estou aqui.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso imaginar meu cachorro chegar na porta do meu quarto e eu não estar lá para deixá-lo entrar.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso deixar os meus pais passarem por essa dor. Eu não posso imaginar como seria para eles viverem sem seu único filho.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso deixá-los ser as últimas pessoas que falaram comigo, deixando-os em estado de choque e se perguntando onde eles falharam. Deixando-os se perguntando como eles não enxergaram que eu estava à beira de um colapso.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso deixá-los ficar até às duas da madrugada, todas as madrugadas, esperando receber uma mensagem minha. Essa mensagem nunca chegaria. Seu telefone nunca tocaria.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso deixar minha mãe sozinha, sem seu melhor amigo. Ninguém deveria ter de perder seu melhor amigo. Não gosto disso.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso deixar meu pai questionando a cada dia que a pergunta "Você está bem?", não foi suficiente para eu lhe responder: "Eu preciso de ajuda. Preciso de ajuda para manter-me vivo." Eu não posso desapontá-lo pelo seu carinho.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso deixar que ela pense que Deus a fez sofrer, deixando-a sem um amigo que a ajudou a manter uma mente aberta e um coração aberto. Eu não posso deixá-la pensar que Deus tenha falhado com ela. Deus não comete erros.
E assim eu continuou vivendo.
Eu não posso passar a mensagem para o outro menino transgênero da minha escola de que é assim mesmo a maneira como o mundo funciona. Alguns de nós permanecemos vivos, alguns de nós não.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso perder minhas infinitas oportunidades apesar da minha situação.
E assim eu continuo vivendo.
Eu não posso transformar meus sonhos em cinzas.
E assim eu continuo vivendo.
E assim eu continuo vivendo.
E por isso vou continuar a viver.



Se você ou alguém que você conhece precisa de ajuda, ligue para o número do CVV: 141 e procure ajuda especializada.


Texto original: When the Suicide Statistics Are Stacked Against You By 
Contributor / https://themighty.com/2016/09/what-world-suicide-prevention-day-means-to-a-transgender-man/
Tradução livre e adaptada




sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Pra que a morte do meu irmão não seja em vão.


Há 5 dias atrás meu irmão, meu ídolo, minha inspiração como artista, um exemplo como pai, como marido e como homem em muitos aspectos, tirou a própria vida com apenas 35 anos de idade. Por mais triste, terrível e doloroso que esteja sendo, sinto que devo expor um pouco dessa tragédia, de tudo que aprendi e estou aprendendo com ela.
Aprendi que é muito reconfortante, dá muita força e é fundamental em uma situação como essa receber carinho. É verdade, não tem muito o que ser dito, mas saiba que qualquer abraço, olhar, mensagem ou carinho como dizer “estou aqui; me sensibilizo com sua dor, como vc está? ” faz muita diferença pra quem passa por algum tipo de situação dolorosa ou de perda.
Por isso quero MUITO agradecer aos meus parentes, amigos que me ajudaram e apoiaram MUITOS, conhecidos, fãs, enfim, TODOS que se deram ao trabalho de conseguir meu telefone ou me escrever uma mensagem, quem o fez por facebook, twitter, instagram. Vou responder com carinho a cada uma das zilhões de mensagens em breve.
Aprendi a ter mais compaixão por todos que estão aqui nesse momento no mundo comigo. Todos nós carregamos uma cruz. O suicídio do meu irmão aliado ao carinho de tanta, tanta, tanta gente, me fez perceber algo que pra mim já era claro: estamos todos conectados.
Estava voltando do Vale do Capão, cheguei em Palmeiras esperando o ônibus pra viajar a madrugada toda, 7 horas até Salvador. Tinha acabado de receber a notícia do suicídio do meu irmão por telefone e estava absolutamente sozinho e bem longe de qualquer abraço conhecido. Absorto no meu sofrimento e abstração do mundo sentei no lugar onde uma senhora de uns 50 anos estava sentada. Ela foi super grosseira comigo me enxotando agressivamente do lugar dela. Eu não revidei, nem respondi, tive uma epifania naquele instante. Percebi que tinha que ser gentil e educado. Além de não ajudar em nada ali, uma resposta na mesma vibração negativa, me deixaria emocionalmente ainda pior e espalharia mais energia negativa e rancor. Além disso eu não sei o peso da cruz que havia por trás daquele amargor e grosseria, bem como ela não sabia do peso da cruz que eu carregava naquele momento. Não sou Jesus nem Buddha, mas gentileza gera gentileza, compaixão gera compaixão e a gente precisa ter mais compaixão uns com os outros, todo o mundo só tem a ganhar com isso, e isso só depende da atitude diária de cada um de nós.
Aprendi a ter mais amor e a resolver hoje, não amanhã ou semana que vem as pendências que eu tenho na minha vida.
Nunca me dei mal com meu irmão, mas ele era muito tímido e fechado. Sempre tive desejo de ser mais amigo dele e me sinto muito feliz de ter buscado e conseguido isso antes dele morrer. Tenho certeza que este momento agora seria muito mais difícil caso não tivesse buscado essa aproximação, caso eu não tivesse dito que amava ele, caso não tivesse conversado tanto nos últimos dias, caso não tivesse falado no domingo que ele não estava sozinho e que podia contar comigo pro que quisesse e precisasse. Não deixe pra amanhã a aproximação de quem está distante de você, a fala presa na garganta, porque o amanhã com essa pessoa pode não existir. Não tenha vergonha de dizer que ama seus entes queridos.
Aprendi um significado mais profundo de livre arbítrio.
Quando alguém próximo a você comete suicídio quase todos que conheciam a pessoa tem a sensação de que poderiam ter salvado ela, caso tivessem feito ou deixado de fazer algo. Esse sentimento é um equívoco pois ele só surge diante de uma perspectiva que não se tinha antes do ocorrido. Ninguém, absolutamente ninguém que tenha o mínimo apreço pela vida da pessoa que se matou, deixaria de ajudá-la, ou de tentar convencê-la de não fazer isso, caso já soubesse que a pessoa poderia de fato vir a se matar.
Além disso, ouvi diversos casos de pessoas que perderam alguém através de um suicídio que demonstram que a determinação da pessoa é tamanha que não há quase nada que a impeça de tomar essa atitude. E o fato é: não aconteceria caso ela própria não escolhesse esse caminho.
Existem diversas razões pela qual uma pessoa escolhe esse caminho de tirar a própria vida, um deles é a depressão. Não pretendo entrar em detalhes dos sintomas e curas desta doença, mas quero sim deixar claro que é uma doença séria que precisa de tratamento. O problema é que é difícil distinguir traços de personalidades fechadas com depressão, e você pode tentar alertar as pessoas da seriedade de cuidar da cabeça, fazer de tudo pra ajudá-las, mas só a própria pessoa tem o livre arbítrio de andar com as próprias pernas até o consultório.
Se hoje me elogiam pela minha serenidade e clareza em um momento tão duro, aceito e agradeço o elogio, mas o mérito é da fé, do amor e da psicologia. Fé e amor são experiências pessoais minhas, mas a psicologia é uma ciência ao alcance de todos.
Assim espero que se divulgue e se fale mais de como é saudável cuidarmos da nossa mente, que se fale mais da seriedade dessa doença, que as pessoas não deixem de buscar tratamento psicológico por preconceito e ignorância. Terapia e psicologia não é frescura, besteira, ou coisa pra quem é maluco como já ouvi de gente bronca, ela pode aliviar e até salvar muitas vidas.
Escrevo esse texto com o intuito de que minha mensagem atinja o maior número de pessoas possível pra que não só eu minha família e as pessoas diretamente conectadas ao Fausto aprendamos algo com essa situação trágica. Exponho um pouco da minha vida e da vida do meu irmão pra que você que lê não precise passar por algo traumático como eu pra praticar estas lições, pra que essa mensagem sirva de alento pra quem já passou e não superou ou para quem venha a passar por essa mesma situação, escrevo pra que a morte e o sofrimento do meu irmão não sejam em vão, pra tentar passar um pouco desse amor que eu aprendi a ter ainda maior pela minha vida, pela vida dos meus familiares e amigos, pela vida de pessoas como você que lê. Ainda que não nos conheçamos: estamos todos conectados.
Franco Fanti
Este texto foi publicado por Franco Fanti, irmão de Fausto Fanti (Hermes e Renato), em 05/08/2014.




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quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Vale A Pena Viver?

Drauzio – Tive um paciente, um homem muito equilibrado, que depois de muitas crises de depressão entrou numa especialmente difícil, rebelde ao tratamento. Certa feita, ele me disse: Olhe, sei o que está acontecendo comigo. Estou num quadro depressivo. Já passei por isso outras vezes, mas este está especialmente difícil. Se for para viver assim, acho que não vale a pena. Para mim, o existir tornou-se insuportável.
Alexandrina Meleiro – Esse “existir não vale a pena” é um sintoma da depressão muito comum nas pessoas que atendo e eu procuro fazer uma aliança com elas. Peço-lhes um tempo para que possa reverter quimicamente o processo. Quando sentem que há esperança, que seu problema tem saída e solução, conseguem suportar essa fase terrível.
Com frequência encontramos pacientes com doenças graves, em situação difícil, dizendo que não vale a pena viver assim. Vale. Quando a depressão começa a melhorar com o tratamento e tiramos o véu que cobre seus olhos, a solução aparece. No filme Philadelfia, há uma cena que me marcou e que costumo contar para as pessoas. O protagonista é um paciente com Aids, na época em que esses doentes eram muito discriminados. Num dado momento, ele se olha no espelho e fala: Não há problema sem solução.
Isso é uma verdade profunda. A solução existe, embora às vezes não a enxerguemos. Pode não ser a solução ideal, perfeita, mas é a possível naquela hora. Se houver flexibilidade para aceitá-la como se apresenta, veremos que a vida sempre vale a pena.


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